Convertei-vos e crede no Evangelho
Homilia da Quarta-feira de cinzas 17/2/2021 (Mt 6, 1-6.16-18)
Prezados irmãos e irmãs,
Estamos iniciando mais uma quaresma. Estamos aqui porque desejamos vivê-la unidos a Cristo que sobe o Calvário. Lá ele morre na cruz para nos salvar. A quaresma nos mergulha na contemplação da paixão e morte de Jesus, mas também nos prepara para celebrar a Páscoa, na glória da sua ressurreição que é vida nova, vida eterna e feliz.
Ao percorrer o caminho quaresmal que nos conduz às celebrações pascais, recordamos Aquele que na sua kénosis, “Se rebaixou a Si mesmo, tornando-Se obediente até à morte e morte de cruz” (Fl 2, 8). É tempo de buscarmos a conversão, de correspondermos à graça de Deus que deseja agir em nós. Neste tempo de conversão, renovamos a nossa fé em Jesus Cristo. Ele é o caminho, a verdade e a vida.
O jejum, a oração e a esmola – tal como são apresentados por Jesus na sua pregação como ouvimos no evangelho (cf. Mt 6, 1-18) – são as condições para a nossa conversão e sua expressão. O caminho da experiência de privação é o jejum que leva a desejar a justiça do Reino. A atenção e os gestos de amor pelo homem ferido e excluído, é a esmola em forma de partilha. O diálogo filial com o Pai do céu é a oração. Eles permitem-nos encarnar uma fé sincera, uma esperança viva e uma caridade operosa.
Somos convidados hoje a deixar-nos alcançar pela Palavra de Deus, que nos é transmitida pela Igreja. Esta Palavra é o próprio Cristo que conduz à plenitude da Vida. Quaresma é um tempo para acreditar, ou seja, para receber Deus na nossa vida permitindo-Lhe «fazer morada» em nós (cf. Jo 14, 23). A Palavra de Deus nos dá esperança! Passemos estes quarenta dias com Jesus no deserto, fazendo silêncio em nosso coração para encontrá-lo em nosso interior.
Sobre a esperança, diz-nos o papa Francisco: “No contexto de preocupação em que vivemos atualmente onde tudo parece frágil e incerto, falar de esperança poderia parecer uma provocação. O tempo da Quaresma é feito para ter esperança, para voltar a dirigir o nosso olhar para a paciência de Deus, que continua a cuidar da sua Criação, não obstante nós a maltratarmos com frequência (cf. Laudato si’, 32-33.43-44). É ter esperança naquela reconciliação a que nos exorta apaixonadamente São Paulo: «Reconciliai-vos com Deus» (2 Cor 5, 20). Recebendo o perdão no Sacramento que está no centro do nosso processo de conversão, tornamo-nos, por nossa vez, propagadores do perdão: tendo-o recebido nós próprios, podemos oferecê-lo através da capacidade de viver um diálogo solícito e adotando um comportamento que conforta quem está ferido. O perdão de Deus, através também das nossas palavras e gestos, possibilita viver uma Páscoa de fraternidade” (Papa Francisco in Mensagem da Quaresma – 2021).
A Conferência dos Bispos do Brasil nos propõe a Campanha da Fraternidade como um caminho de conversão quaresmal. Numa sociedade como a nossa, repleta de conflitos e violência, ela nos convida para voltarmos o olhar para Jesus Cristo, pois, ele é a nossa paz. “Do que era dividido fez uma unidade” (Ef 2,14). Esta CF quer nos chamar a atenção para o valor do diálogo como um compromisso de amor. Seu tema é “Fraternidade e diálogo: compromisso de amor”. Quem ama dialoga, a exemplo de Jesus que dialogava com todos: judeus, samaritanos, ricos e pobres. Ninguém ficou fora do amor de Jesus.
Existem divergências sobre esta CF/2021 por ser este ano, ecumênica. Podemos divergir de algumas coisas. A divergência faz parte do diálogo. O que não podemos é dividir, criar confronto, animosidade, como alguns estão fazendo. A verdade deve ser dita na caridade e nunca na animosidade. O modo de fazer às vezes não é o melhor, mas a proposta do ecumenismo é plenamente válida. O Catecismo da Igreja Católica diz: “A missão da Igreja exige o esforço rumo à unidade dos cristãos” (cf. CIC n. 855). Também os números 817-822 falam das feridas da unidade e o caminho rumo à unidade dos cristãos, para realizar o desejo de Jesus: “que todos sejam um” (Jo 17,21).
Esta CF/2021 busca, portanto, construir unidade com outras denominações cristãs. Rezemos pedindo ao Espírito Santo que nos ilumine e ensine a trilhar o caminho de um sadio ecumenismo. Rezemos pedindo a Deus que o diálogo seja a verdadeira arma no relacionamento social e não as armas de fogo. Ampliar a liberação de armas de fogo como estão querendo fazer no Brasil, é um perigo e o resultado será sem dúvida o aumento da violência. Jesus sempre condenou a violência por isso, os cristão devem seguir seu exemplo na busca do diálogo, da unidade e da paz. Jesus disse; “Bem aventurados os que trabalham pela paz, eles serão chamados filhos de Deus”(Mt 5, 9).
Nesta santa missa queremos rezar especialmente pelas vítimas da Covid-19 que já somam 240.000 pessoas. A situação é mais que grave, é trágica, principalmente pelo atraso na vacinação e a falta de cuidado de muitos com as normas sanitárias. Porém não devemos ceder diante das incertezas trazidas pela crise social, política e econômica na qual estamos mergulhados. Na perspectiva da fé, sempre há esperança porque Deus caminha conosco. Coragem!
Convido todas as nossas comunidades, cada um dos que se reúnem como membros de nossa Igreja Particular de Santo André, a entrar no clima desta quaresma, com muita determinação. Ela será diferente devido à pandemia, mas nossa fé é a mesma e deve crescer. Crescer na certeza de que alguém caminha conosco. Este alguém é Jesus, “aquele que nos ama e nos libertou” (Ap 1,5).
Amém.
Dom Pedro Carlos Cipollini